sábado, 12 de outubro de 2024

Dia das Crianças

talvez o que eu peça esteja distante demais

talvez esteja tocando a superfície do céu

testando o limite do que pode ser pedido pelos mortais


então hoje eu reduzo minha preces


gostaria somente de escolher o meu sonho

e que a sensação inerte do descanso ainda perdure por alguns segundos quando acordo

antes que eu me lembre de todos que partiram

antes que essa dor tão antiga e enraizada se mostre novamente


de vez em quando acho até engraçado como a morte é algo tão misterioso

é a única certeza que temos da vida, afinal

deveria ser tão simples quanto olhar para a lua

ou ver um cavalo correndo pelos campos

essas coisas ancestrais que alimentam a alma e nos lembram de que somos mais bicho do que gente


acredito ter feito as pazes com o meu próprio fim ainda na infância 

lembro-me de quando era pequeno e disse para a minha avó que não gostaria de viver depois que ela e meu avô se fossem


ela me disse para esquecer isso

que pensar na morte é coisa de gente velha


bem, sou mais velho hoje

e meu sonho é simples

                ou deveria ser


é andar novamente pelos corredores da casa em que cresci

sentindo o ar frio da minha terra

e vendo meus avós sentados no sofá


tudo pareceria completo e infinito novamente

como uma criança a brincar e ver o mundo


estou tão cansado...

quinta-feira, 3 de outubro de 2024

Testamento

Sonhei sonhos de pedra: duros e incapazes de apaziguar a minha mente.

Acreditava ser capaz de demonstrar às pessoas o quanto elas significam para mim. E errei novamente. Farei diferente no tempo que me resta.

Algumas semanas? Talvez. Sinto minha morte tão próxima... Mas deixarei para falar dela em outro momento — ou então não falarei nunca. Ocupei muito de minha mente pensando no meu próprio fim.

A tragédia da minha vida sempre foi a possibilidade de não morrer antes das pessoas que amo. Não queria viver o luto pelo meu avô. Não queria viver o luto do meu amigo. Não quero viver o luto de minha avó.

Meus pensamentos estão em um transe desgovernado há mais de dez anos. Agora sinto-me quase numa infância revelada, nua, uma nostalgia incomum até mesmo para um nostálgico como eu — e que toma conta dos meus sentidos. Perdi parte do meu espírito quando meu avô se foi. Perdi parte da minha história agora que um de meus melhores amigos também deixou este mundo.


Que a magia — do solo que pisamos, desta vida, do que há além — me conceda uma chance de transmitir a vocês aquilo que meus lábios foram letárgicos ou temerosos em dizer: eu te amo.


Eu te amo.

Eu te amo.

Eu te amo.


Que meus mortos descansem em paz.

Estou chegando.